segunda-feira, 23 de agosto de 2010

Capitulo 6- TIPO SANGUÍNEO

Eu a segui o dia inteiro pelos olhos de outras pessoas, mal consciente dos meus arredores.


Não pelos olhos de Mike Newton, porque eu não podia mais suportar nenhuma de suas fantasias ofensivas, e não pelos de Jessica, porque seu ressentimento com relação a Bella me deixava nervoso de uma forma que não era segura para a garota sem importância . Angela Weber era uma boa escolha quando seus olhos estavam disponíveis; ela era gentil – sua cabeça era um lugar fácil de se estar. E às vezes eram os professores que forneciam a melhor vista.

Eu estava surpreso, vendo ela tropeçar o dia inteiro – sobre rachaduras no solo, livros largados, e, mais freqüentemente, nos próprios pés – que as pessoas pelas quais eu estava espionando achavam Bella desajeitada.

Eu refleti sobre isso. Era verdade que ela às vezes tinha problemas para se manter em pé. Eu me lembrei dela tropeçando na mesa naquele primeiro dia, escorregando no gelo antes do acidente, caindo sobre a parte de baixo do batente da porta ontem... que estranho, eles estavam certos. Era era desajeitada.

Eu não sabia por que isso era engraçado para mim, mas eu ri alto enquanto caminhava de História da América para Inglês, e várias pessoas me olharam estranho. Como eu nunca havia percebido isso antes? Talvez porque havia algo muito gracioso sobre seu jeito calmo, a maneira como ela segurava sua cabeça, o arco de seu pescoço...

Não havia nada de gracioso sobre ela agora. O Sr. Varner a assistia enroscando a ponta da bota no carpete e literalmente caindo em sua cadeira.

Eu ri de novo.

O tempo passou com uma lentidão inacreditável enquanto eu esperava por minha chance de vê-la com os meus próprios olhos. Finalmente, o sino tocou. Eu caminhei muito rápido até o refeitório, para assegurar meu lugar - fui o primeiro a chegar. Escolhi uma mesa que em geral estava vazia, e com certeza continuaria assim comigo sentado nela.

Quando minha família entrou e me viu sentado sozinho num lugar novo, eles não ficaram surpresos. Alice devia tê-los alertado.

Rosalie passou rápido do meu lado, sem me olhar.

Idiota.

Rosalie e eu nunca tivemos uma relação fácil – eu a havia ofendido na primeira vez em que ela me ouviu falar, e foi daí para pior – mas parecia que ela estava ainda mais mal-humorada que o normal nos últimos dias. Eu suspirei. Rosalie fazia tudo pensando em si mesma.

Jasper me deu um meio-sorriso quando ele passou.

Boa sorte, ele pensou cheio de dúvidas.

Emmet virou os olhos e balançou a cabeça.

Ficou louco, coitado.

Alice estava com um sorriso enorme, seus dentes brancos brilhando muito.

Eu posso conversar com Bella agora??

“Mantenha-se fora disso”, eu disse entre dentes.

Sua expressão despencou, mas então se iluminou mais uma vez.

Tudo bem. Seja teimoso. É apenas questão de tempo.

Eu suspirei de novo.

Não esqueça sobre o laboratório de biologia de hoje, ela me lembrou.

Eu consenti com a cabeça. Não, eu não tinha me esquecido.

Enquanto eu esperava Bella chegar, a segui pelos olhos do calouro que caminhava atrás de Jessica no caminho até o refeitório. Ela estava tagarelando sobre o baile que se aproximava, mas Bella não disse nada. Não que Jessica desse muita chance.

No momento em que Bella passou pela porta, seus olhos correram na direção da mesa onde meus irmãos se sentavam. Ela observou por um momento, e então sua testa se enrugou e seus olhos caíram para o chão. Ela não havia me notado aqui.

Ela parecia tão... triste. Eu senti uma poderosa urgência de me levantar e ir para o lado dela, confortá-la de alguma forma, só que eu não sabia o que ela acharia reconfortante. Eu não fazia idéia do que fazia ela se sentir assim. Jessica continuou a tagarelar sobre o baile. Será que Bella estava triste porque não poderia ir? Não muito provável...

Mas isso podia ser remediado, se ela desejasse.

Ela comprou uma bebida para o almoço e nada mais. Isso estava certo? Ela não precisava de mais nutrição que isso? Eu nunca havia prestado muita atenção à dieta de um humano antes.

Os humanos eram irritantemente frágeis! Havia um milhão de coisas diferentes com que se preocupar...

“Edward Cullen está te encarando de novo”, eu ouvi Jessica dizer. “Por que será que ele está sentado sozinho hoje?”

Eu fiquei grato a Jessica – apesar de que ela estava ainda mais ressentida agora – porque a cabeça de Bella pulou e os olhos dela procuraram até encontrar os meus.

Não havia mais nenhum traço de tristeza no seu rosto. Eu me permiti ter a esperança de que ela estava triste porque pensou que eu tinha ido embora mais cedo, e essa esperança me fez sorrir.

Eu gesticulei com meu dedo para ela se juntar a mim. Ela pareceu tão surpresa com isso que eu queria provocá-la de novo.

Então eu pisquei, e seu queixo caiu.

“Ele quer dizer você?”, Jéssica perguntou rudemente.

“Talvez ele precise de ajuda com a tarefa de Biologia”, ela disse numa voz baixa e incerta. “Um, melhor eu ir ver o que ele quer”.

Isso era outro sim.

Ela tropeçou duas vezes enquanto vinha até minha mesa, apesar de que no seu caminho não havia nada a não ser o linóleo plano. Sério, como eu não tinha percebido isso antes? Eu havia estado prestando mais atenção aos seus pensamentos silenciosos, eu supus... o que mais eu havia perdido?

Manter a honestidade, manter a leveza, eu recitei para mim mesmo.

Ela parou atrás da cadeira de frente pra mim, hesitando. Eu inalei profundamente, pelo nariz desta vez ao invés da boca.

Sinta queimar, eu pensei secamente.

“Por que você não se junta a mim hoje?”, eu perguntei.

Ela puxou a cadeira e sentou, me encarando o tempo todo. Ela parecia nervosa, mas sua aceitação física era ainda outro sim.

Eu a esperei falar.

Levou um momento, mas finalmente, ela disse: “Isso é diferente”.

“Bem...”, eu hesitei. “Eu decidi que já que vou para o inferno, posso pelo menos fazer direito”.

O que me fez dizer isso? Eu supus que fosse a honestidade, no mínimo. E talvez ela ouviria o aviso subentendido que minhas palavras implicavam. Talvez ela percebesse que ela devia se levantar e sair daqui o mais rápido possível...

Ela não se levantou. Ela me encarou, esperando, como se eu tivesse deixado minha frase incompleta.

“Você sabe que eu não tenho a menor idéia do que você quer dizer”, ela disse quando eu não continuei.

Que alívio. Eu sorri.

“Eu sei”.

Estava difícil ignorar os pensamentos gritados para mim detrás dela – e eu queria mesmo mudar de assunto.

“Eu acho que seus amigos estão bravos comigo por eu ter te roubado”.

Isso não pareceu preocupá-la. “Eles vão sobreviver”.

“Mas eu posso não te devolver”. Eu nem sabia se agora estava tentando ser honesto, ou apenas provocá-la de novo. Estar perto dela me fazia ter dificuldade em compreender meus próprios pensamentos.

Bella engoliu alto.

Eu ri de sua expressão. “Você parece preocupada”. Não deveria ser engraçado... ela deveria se preocupar.

“Não”. Ela mentia mal; não ajudou que sua voz partiu. “Surpresa, na verdade... o que causou tudo isso?”

“Eu te disse”, eu a recordei. “Estou cansado de tentar ficar longe de você. Então estou desistindo”. Eu segurei meu sorriso no lugar com um pouco de esforço. Simplesmente não estava funcionando – tentar ser honesto e casual ao mesmo tempo.

“Desistindo?”, ela repetiu, confusa.

“Sim – desistindo de tentar ser bom”. E, pelo jeito, desistindo de tentar ser casual. “Agora eu vou fazer o que eu quero, e deixar os dados rolarem”. Isso era honesto o suficiente. Que servisse de alerta, também.

“Você me perdeu de novo”.

Eu era egoísta o bastante para ficar feliz que fosse esse o caso. “Eu sempre falo demais quando estou conversando com você – este é um dos problemas”.

Um problema bem insignificante, comparado com o resto.

“Não se preocupe”, ela reafirmou. “Eu não entendo uma palavra”.

“Então, em bom português, somos amigos agora?”

Eu ponderei por um segundo. “Amigos...”, eu repeti. Eu não gostava de como soava. Não era o bastante.

“Ou não”, ela murmurou, parecendo embaraçada.

Será que ela pensava que eu não gostava dela tanto assim?

Eu sorri. “Bom, podemos tentar, eu acho. Mas estou te avisando que não sou um bom amigo para você”.

Eu esperei a resposta dela, dividido – desejando que ela finalmente fosse ouvir e entender, e pensando que eu poderia morrer se ela o fizesse. Que melodramático. Eu estava me tornando um baita de um humano ao redor dela.

O coração dela acelerou. “Você diz isso bastante”.

“Sim, porque você não me escuta”, eu disse, mais uma vez intenso demais. “Ainda estou esperando você acreditar. Se for inteligente, vai me evitar”.

Ah, mas eu permitiria isso, se ela tentasse?

Seus olhos se estreitaram. “Eu acho que você também já deixou bem claro o que pensa sobre o meu intelecto”.

Eu não tinha certeza absoluta do que ela queria dizer, mas eu sorri para desculpar-me, pensando que devia tê-la ofendido acidentalmente.

“Então”, ela disse devagar, “já que eu estou sendo... não inteligente, vamos tentar ser amigos?”

“Isso parece correto”.

Ela olhou para baixo, encarando intensamente a garrafa de limonada em suas mãos.

A antiga curiosidade me atormentou.

“O que você está pensando?”, eu perguntei – era um alívio finalmente dizer as palavras em voz alta.

Ela encontrou meu olhar, e sua respiração acelerou enquanto suas bochechas coravam de um rosa claro. Eu inalei, sentindo o gosto disso no ar.

“Eu estou tentando compreender o que você é”.

Eu segurei o sorriso no meu rosto, travando meus traços como estavam, enquanto o pânico se retorcia no meu corpo.

Claro que ela estava pensando nisso. Ela não era burra. Eu não podia esperar que ela ignorasse algo tão óbvio.

“E você está tendo algum sucesso?”, eu perguntei o tão levemente quanto consegui.

“Não muito”, ela admitiu.

Eu soltei um risinho de alívio. “Quais são suas teorias?”

Elas não poderiam ser piores que a verdade, não importava o que ela inventasse.

Suas bochechas ficaram vermelhas, e ela não disse nada. Eu podia sentir o calor de sua corada no ar.

Eu tentei usar meu tom persuasivo nela. Costumava funcionar bem com humanos.

“Você não vai me dizer?”, eu sorri, encorajando-a.

Ela balançou a cabeça. “Embaraçoso demais”.

Ugh. Não saber era o pior de tudo. Por que as especulações dela a embaraçariam? Eu não podia suportar não saber.

“Isso é realmente frustrante, sabia?”

Minha reclamação fez alguma coisa faiscar dentro dela. Seus olhos brilharam e as palavras saíram mais rápido que o usual.

“Não, eu simplesmente não consigo imaginar por que isso seria frustrante – só porque alguém se recusa a te dizer o que está pensando, mesmo que o tempo todo ele faça pequenos comentários especificamente criados para te deixar acordada a noite, imaginando o que ele quis dizer... nossa, por que isso seria frustrante?”

Eu franzi a testa, chateado por perceber que ela tinha razão. Eu não estava sendo justo.

Ela continuou. “Ou melhor, digamos que essa pessoa também tenha feito um monte de coisas bizarras – de salvar sua vida num dia sob as condições mais impossíveis, até te tratar como uma paria no dia seguinte, e nunca explicando nada disso também, mesmo tendo prometido. Isso, também, seria muito não-frustrante”.

Foi o discurso mais longo que eu já tinha ouvido sair da boca dela, e me deu uma nova qualidade para minha lista.

“Você tem um temperamento e tanto, não?”

“Eu não gosto de dois pesos, duas medidas”.

Ela tinha total razão na sua irritação, claro.

Eu olhei para Bella, imaginando como poderia fazer qualquer coisa boa por ela, até que a gritaria silenciosa da cabeça de Mike Newton me distraiu.

Ele estava tão irado que me fez rir.

“O quê?”, ela demandou.

“Seu namorado parece achar que estou sendo desagradável com você – ele está debatendo se vem ou não separar nossa briga”. Adoraria vê-lo tentar. Eu ri de novo.

“Eu não sei do que você está falando”, ela disse numa voz fria. “Mas tenho certeza de que está errado”.

Eu adorei que ela o dispensou com o que disse.

“Não estou. Te disse, a maioria das pessoas é fácil de ler”.

“Menos eu, claro”.

“Sim. Menos você”. Será que ela tinha que ser a exceção para tudo? Não seria mais justo – considerando tudo o mais com que eu tinha que lidar – se eu pudesse ouvir pelo menos alguma coisa de sua mente? Era pedir muito? “Eu me pergunto por quê”.

Eu olhei para dentro dos olhos dela, tentando de novo...

Ela fugiu com o olhar. Ela abriu sua limonada e tomou um gole rápido, seus olhos a mesa.

“Você não está com fome?”, eu perguntei.

“Não”. Ela olhou a mesa vazia entre nós. “E você?”

“Não, eu não estou com fome”, eu disse. Definitivamente com isso eu não estava.

Ela encarou a mesa com os lábios crispados. Eu aguardei.

“Você pode me fazer um favor?”, ela perguntou, subitamente encontrando meu olhar de novo.

O que ela podia querer de mim? Será que ela perguntaria a verdade que eu não tinha a permissão de contar – a verdade que eu não queria que ela nunca, nunca soubesse?

“Isso depende do que você quer”.

“Não é muito”, ela prometeu.

Eu esperei, novamente curioso.

“Eu só estava pensando...”, ela disse lentamente, encarando a garrafa de limonada, traçando a boca da garrafa com o mindinho. “Se você poderia me avisar com antecedência na próxima vez em que decidir me ignorar? Só para que eu possa me preparar”.

Ela queria um aviso? Então ser ignorada por mim devia ser uma coisa ruim... eu sorri.

“Parece justo”, eu concordei.

“Obrigada”, ela disse, levantando o rosto. Sua face estava tão aliviada que eu queria rir com meu próprio alívio.

“Então posso fazer uma pergunta em retribuição?”, perguntei esperançoso.

“Uma”, ela permitiu.

“Me conte uma teoria”.

Ela corou. “Não essa uma”.

“Você não especificou, apenas me prometeu uma resposta”, eu argumentei.

“E você já quebrou promessas”, ela contra-argumentou.

Me pegou.

“Só uma teoria – eu não vou rir”.

“Sim, você vai”. Ela parecia ter muita certeza disso, apesar de que eu não conseguia imaginar onde poderia estar a graça.

Tentei dar mais uma chance à persuasão. Olhei para o fundo dos olhos dela – uma coisa fácil de se fazer, com olhos tão profundos – e sussurrei, “Por favor?”

Ela piscou, e sua expressão ficou vazia.

Bem, não era bem essa a reação que eu estava esperando.

“Er, quê?”, ela perguntou, parecendo atordoada. O que havia de errado com ela?

Mas eu ainda não tinha desistido.

“Por favor, me conte só uma teoriazinha”, eu pedi na minha voz macia, não-assustadora, segurando o olhar dela no meu.

Para minha surpresa e satisfação, finalmente funcionou.

“Um, bem, mordido por uma aranha radioativa?”

Gibis? Não era de se estranhar que ela tivesse achado que eu ia rir.

“Não foi muito criativa”, eu a reprovei, tentando disfarçar meu alívio.

“Sinto muito, foi tudo o que eu consegui pensar”, ela disse, ofendida.

Isso me aliviou ainda mais. Eu podia provocá-la de novo.

“Você não chegou nem perto”.

“Sem aranhas?”

“Sem”.

“E nenhuma radioatividade?”

“Nenhuma”.

“Droga”, ela suspirou.

“Também não me incomodo com kriptonita”, eu disse rápido – antes que ela pudesse perguntar sobre mordidas e então eu tive que rir, porque ela pensou que eu fosse um super-herói.

“Você não ia rir, lembra?”

Eu apertei meus lábios.

“Uma hora eu descubro”, ela prometeu.

E quando ela descobrisse, ela fugiria.

“Eu queria que você não tentasse”, eu disse, o tom provocativo indo embora.

“Porque...?”

Eu devia a ela honestidade. Mesmo assim, eu tentei sorrir, para que minhas palavras soassem menos ameaçadoras. “E se eu não for um super-herói? E se eu for o cara mau?”

Seus olhos se arregalaram por uma fração de segundo, e sua boca abriu um pouco. “Oh”, ela disse. E então, depois de outro segundo, “entendi”.

Ela finalmente havia me ouvido.

“Entendeu?”, eu perguntei, tentando esconder minha agonia.

“Você é perigoso?”, ela adivinhou. Sua respiração se prolongou, e seu coração acelerou.

Eu não consegui responder. Então era esse o meu último momento com ela? Agora ela ia fugir? Será que eu tinha a permissão de dizer a ela que a amava antes que ela partisse? Ou isso a assustaria ainda mais?

“Mas não mau”, ela suspirou, balançando a cabeça, sem medo nos seus olhos claros. “Não, eu não acho que você seja mau”.

“Você está errada”, eu respirei.

Claro que eu era mau. Eu não estava aqui agora, me regojizando do fato de que ela pensava melhor de mim do que eu merecia? Se eu fosse uma pessoa boa, eu ficaria longe dela.

Como desculpa, estiquei a mão pela mesa até alcançar a tampinha da sua limonada. Ela não fugiu da minha mão subitamente próxima. Ela realmente não estava com medo de mim. Ainda.

Eu girei a tampinha como um pião, olhando para ela ao invés de para Bella. Meus pensamentos giravam numa espiral. Corra, Bella, corra. Eu não conseguia me fazer pronunciar as palavras em voz alta.

Ela ficou de pé num salto. “Nós vamos nos atrasar”, ela disse, antes que eu começasse a me preocupar que ela tivesse de alguma forma ouvido meu aviso silencioso.

“Não vou para a aula”.

“Por quê?”

Porque eu não quero te matar. “É saudável cabular de vez em quando”.

Para ser mais preciso, era mais saudável para os humanos se os vampiros cabulassem em dias em que sangue humano seria derramado. O Sr. Banner ia fazer tipagem sanguínea hoje. Alice já havia cabulado a aula dela de manhã.

“Bom, eu vou”, ela disse. Isso não me surpreendeu. Ela era responsável – sempre fazia a coisa certa.

Ela era o oposto de mim.

“Te vejo mais tarde então”, eu disse, tentando ser casual de novo, olhando para baixo, para a tampinha girando. E, a propósito, eu te adoro... de maneiras assustadoras e perigosas.

Ela hesitou, e eu esperei por um momento que ela fosse ficar comigo no fim das contas. Mas o sinal tocou de novo e ela saiu apressada.

Eu esperei até que ela tivesse ido, e então coloquei a tampinha no bolso – um souvenir da conversa mais importante – e caminhei na chuva até meu carro.

Eu coloquei meu CD calmante favorito – o mesmo que havia ouvido naquele primeiro dia – mas eu não estava escutando as notas de Debussy por muito tempo. Outras notas corriam pela minha cabeça, o fragmento de uma melodia que me agradou e intrigou. Eu desliguei o rádio e escutei à música na minha cabeça, brincando com o fragmento até que ele evoluiu para uma harmonia completa. Instintivamente, meus dedos se moveram no ar sobre um piano imaginário.

A nova composição estava realmente saindo quando minha atenção foi tomada por uma onda de angústia mental.

Será que ela vai desmaiar? O que eu faço? Mike se desesperava.

A cem metros de distância, Mike Newton estava baixando o corpo sem nenhuma firmeza de Bella para a calçada. Ela despencou contra o concreto molhado sem reação, seus olhos fechados, sua pele branca como a de um cadáver.

Eu quase arranquei a porta do carro.

“Bella?”, eu gritei.

Não houve alteração no seu rosto sem vida quando eu gritei o seu nome.

Meu corpo inteiro ficou mais frio que o gelo.

Eu estava consciente da surpresa agravada de Mike enquanto eu vasculhava furiosamente os seus pensamentos. Ele só estava pensando na raiva que tinha de mim, então eu não consegui descobrir o que havia de errado com Bella. Se ele tivesse feito qualquer coisa para machucá-la, eu iria aniquilá-lo.

“O que aconteceu – ela está machucada?”, eu demandei, tentando me focar nos pensamentos dele. Era enlouquecedor ter que andar no passo humano. Eu não devia ter chamado atenção para a minha aproximação.

Então eu pude ouvir o coração dela batendo e sua respiração regular. Enquanto eu olhava, ela apertou os olhos ainda mais fechados. Isso aliviou um pouco meu pânico.

Eu vi as memórias vacilando na cabeça de Mike, uma mistura de imagens da aula de Biologia. Gotas de vermelho contra os cartões brancos...

Tipagem sanguínea.

Eu parei onde estava, segurando a respiração. O aroma dela era uma coisa, seu sangue escorrendo era outra completamente diferente.

“Eu acho que ela desmaiou”, Mike disse, nervoso e ressentido ao mesmo tempo. “Eu não sei o que aconteceu, ela nem furou o dedo”.

O alívio me inundou, e eu respirei de novo, provando do ar. Ah, eu podia sentir o cheiro do pequeno sangramento no furo no dedo de Mike. Antigamente, isso me atrairia.

Eu me ajoelhei ao lado dela enquanto Mike permanecia perto de mim, furioso pela minha intervenção.

“Bella. Você está me ouvindo?”

“Não”, ela resmungou. “Vá embora”.

Eu ri. Ela estava bem.

“Eu estava levando ela para a enfermeira”, Mike disse. “Mas ela não quis continuar”.

Eu não ia ficar aqui argumentando com esse infeliz.

Excitado e terrificado, metade agradecido e metade aflito com a situação que fazia com que tocá-la fosse uma necessidade, eu gentilmente levantei Bella da calçada e a carreguei em meus braços, encostando apenas em suas roupas, mantendo o máximo de distância entre nossos corpos quanto era possível. No mesmo movimento, já estava caminhando rápido, apressado para tê-la a salvo – em outras palavras, mais afastada de mim.

Seus olhos se abriram rápido, perplexos.

“Me ponha no chão”, ela ordenou numa voz fraca – embaraçada de novo, eu deduzi de sua expressão. Ela não gostava de demonstrar fraqueza.

Eu mal ouvi Mike Newton gritando em protesto atrás de nós.

“Você está horrível”, eu disse, sorrindo de alívio porque não havia nada de errado com ela a não ser uma cabeça leve e um estômago fraco.

“Me coloque de volta na calçada”, ela disse. Seus lábios estavam brancos.

“Então você desmaia quando vê sangue?”. Dava para ficar mais irônico?

Ela fechou os olhos e apertou os lábios.

“E nem mesmo seu próprio sangue”, eu adicionei, meu sorriso ficando mais largo.

Nós estávamos na sala da frente. A porta estava um pouco aberta, e eu a chutei do meu caminho.

A Sra. Cope deu um pulo, alarmado. “Oh, meu...”, ela engasgou enquanto examinava a garota pálida que estava nos meus braços.

“Desmaiou em Biologia”, eu expliquei, antes que sua imaginação voasse muito.

A Sra. Cope se apressou para abrir a porta da enfermaria. Os olhos de Bella estavam arregalados de novo, vigiando-a. Eu ouvi a surpresa da enfermeira mais velha quando coloquei a garota cuidadosamente na cama gasta. Assim que Bella não estava mais nos meus braços, eu deixei o tamanho da sala de distância entre nós. Meu corpo estava excitado demais, faminto demais, os músculos tensos e o veneno jorrando. Ela era tão quente e perfumada.

“Foi só um pequeno desmaio”, eu garanti à Sra. Hammond. “Eles estão fazendo tipagem sanguínea em Biologia”.

Ela acenou com a cabeça, compreendendo agora. “Sempre tem um”.

Eu segurei uma risada. Pode esperar que Bella vai ser esse um.

“Apenas fique deitada por um minuto, querida”, disse a Sra. Hammond. “Já vai passar”.

“Eu sei”, disse Bella.

“Isso acontece sempre?”, a enfermeira perguntou.

“Às vezes”, Bella admitiu.

Eu tentei fingir que minha risada foi uma tossida.

Isso desviou a atenção da enfermeira para mim. “Pode voltar para a classe agora”, ela disse.

Eu a olhei diretamente nos olhos e menti com total confiança. “É para eu ficar aqui com ela”.

Hmm. Eu acho... ah, tanto faz. A Sra. Hammond assentiu com a cabeça.

Funcionava muito bem nela. Por que Bella tinha que ser tão difícil?

“Vou pegar um pouco de gelo para sua testa, querida”, a enfermeira disse, levemente desconfortável por ter olhado nos meus olhos – do jeito que um humano deveria estar – e saiu da sala.

“Você tinha razão”, Bella murmurou, fechando os olhos.

O que ela queria dizer? Eu pulei para a pior conclusão: ela havia aceitado meus avisos.

“Em geral eu estou”, eu disse, tentando continuar soando entretido. “Mas sobre o quê em particular desta vez?”

“Cabular é saudável”, ela suspirou.

Ah, alívio de novo.

Ela ficou quieta então, apenas respirando devagar. Seus lábios começavam a ficar rosados. Sua boca um pouco desbalanceada, o lábio inferior só um pouco mais cheio que o superior. Olhar para a boca dela me fez sentir-me estranho. Me fez querer chegar mais perto dela, o que não era uma boa idéia.

“Você me assustou por um minuto”, eu disse – para recomeçar a conversa, e poder ouvir sua voz de novo. “Eu pensei que Newton estivesse arrastando seu cadáver para enterrar na floresta”.

“Ha ha”, ela disse.

“Sério – já vi cadáveres com uma cor melhor”. Isso era mesmo verdade. “Eu estava preocupado que talvez fosse ter que vingar seu assassinato”. E eu teria vingado.

“Pobre Mike”, ela suspirou. “Aposto que ele está louco”.

Eu pulsei de fúria, mas logo a contive. Sua preocupação certamente era só por pena. Ela era gentil. Só isso.

“Ele simplesmente me odeia”, eu lhe disse, alegre com a idéia.

“Você não sabe disso”.

“Eu vi a cara dele – dava para perceber”. Era provavelmente verdade que ler sua expressão teria me dado informação o suficiente para deduzir isso. Toda essa prática com Bella estava melhorando minha habilidade de ler expressões humanas.

“Como você me viu? Pensei que estivesse cabulando”. O rosto dela parecia melhor – o tom esverdeado havia desaparecido de sua pele translúcida.

“Estava no meu carro, ouvindo um CD”.

A expressão dela mudou completamente, como se uma resposta tão comum a tivesse surpreendido de alguma forma.

Ela abriu os olhos de novo quando a Sra. Hammond voltou com o saco de gelo.

“Aqui está, querida”, a enfermeira disse quando o encostou na testa de Bella. “Você parece melhor”.

“Eu acho que estou bem”, Bella disse, sentando e afastando o gelo. Claro. Ela não gostava de ser cuidada.

As mãos enrugadas da Sra. Hammond se dirigiram à garota, como se fossem forçá-la a deitar de novo, mas então a Sra. Cope abriu a porta e entrou. Com ela veio o cheiro de sangue fresco, só uma brisa.

Invisível na outra sala, Mike Newton ainda estava muito irritado, desejando que o garoto pesado que ele carregava agora fosse a garota que estava aqui comigo.

“Mais um”, disse a Sra. Cope.

Bella desceu da maca num pulo, louca para sair dos holofotes.

“Aqui”, ela disse, entregando a compressa para a Sra. Hammond. “Não preciso disto”.

Mike bufou quando ele meio que empurrou Lee Stevens através da porta. Ainda havia sangue gotejando na mão que Lee segurava junto ao rosto, escorrendo até seu pulso.

“Oh não”. Esta era minha deixa para sair – e aparentemente a de Bella também. “Saia da sala, Bella”.

Ela me olhou confusa.

“Confie em mim – vai”.

Ela virou e segurou a porta antes que ela batesse, correndo pela sala. Eu segui apenas alguns passos atrás dela. Seu cabelo pendente acariciou a minha mão...

Ela se virou para me olhar, com os olhos ainda arregalados.

“”Você realmente me escutou”. Era a primeira vez.

Seu pequeno nariz enrugou. “Eu senti cheiro de sangue”.

Eu fiquei olhando para ela boquiaberto. “As pessoas não conseguem sentir cheiro de sangue”.

“Bom, eu consigo – é isso que me dá enjôo. Tem cheiro de ferrugem... e sal”.

Eu fiquei paralisado, ainda encarando.

Será que ela era mesmo humana? Ela parecia humana. Era macia como uma humana. Cheirava como uma humana – bem, melhor na verdade. Agia como uma humana... mais ou menos. Mas não pensava como uma humana, ou respondia como uma.

Que outra opção havia então?

“O quê?”, ela demandou.

“Nada”.

Mike Newton nos interrompeu, entrando na sala com pensamentos ressentidos, violentos.

“Você parece melhor”, ele lhe disse rudemente.

Minha mão se contraiu, querendo lhe ensinar boas maneiras. Eu teria que me vigiar, ou acabaria realmente matando este garoto detestável.

“Apenas mantenha sua mão no bolso”, ela disse. Por um instante de insensatez, pensei que ela estivesse falando comigo.

“Não tá mais sangrando”, ele respondeu ressentido. “Você vai voltar para a aula?”

“Você tá brincando? Eu teria que dar meia volta e vir pra cá de novo”.

Isso era muito bom. Eu havia pensado que ia ter que perder essa hora inteira com ela, e ao invés disso agora eu tinha tempo extra. Eu me senti ganancioso, a avareza aumentando a cada minuto.

“Sim, eu acho...”, Mike resmungou. “E então, você vai nesse fim de semana? Para a praia?”

Ah, eles tinham planos. Fui inundado pela raiva. Mas era um passeio em grupo. Eu havia visto na cabeça de alguns alunos. Não seriam só eles dois. Eu ainda estava furioso. Me encostei no canto e fiquei parado, tentando me controlar.

“Claro, eu disse que estava dentro”, ela lhe prometeu.

Então ela havia dito sim para ele também. O ciúme queimava, mais doloroso que a sede.

Não, era só um passeio em grupo, eu tentava me convencer. Ela só ia passar um dia com os amigos. Nada mais.

“Vamos nos reunir na loja do meu pai, às dez”. E Cullen NÃO ESTÁ convidado.

“Vou estar lá”, ela disse.

“Te vejo no ginásio, então”.

“Até lá”, ela respondeu.

Ele se arrastou de volta para a aula, seus pensamentos cheios de ira. O que ela vê naquele esquisito? Claro, ele é rico, eu acho. As meninas pensam que ele é gostoso, mas eu não vejo isso. Muito... muito perfeitinho. Eu aposto que o pai dele faz experiências com cirurgia plástica em todos eles. É por isso que eles são todos tão branquinhos e bonitos. Não é natural. E ele é meio que... assustador. Às vezes, quando ele me encara, eu poderia jurar que ele está pensando em me matar... Esquisito...”

Mike não era assim tão inconsistente .

“Ginásio”, Bella repetiu silenciosamente. Um gemido.

Eu olhei para ela, e vi que ela estava triste por causa de alguma coisa de novo. Não sabia muito bem por quê, mas estava claro que ela não queria ir para sua próxima aula com Mike, e eu lhe daria total apoio.

Fui para o seu lado e me inclinei para perto de seu rosto, sentindo o calor de sua pele irradiando para os meus lábios. Eu não ousei respirar.

“Eu posso cuidar disso”, murmurei. “Vá sentar e parecer pálida”.

Ela fez como eu pedi, sentando em uma das cadeiras dobráveis e encostando a cabeça na parede, enquanto, atrás de mim, a Sra. Cope saiu da sala dos fundos e foi para sua mesa. De olhos fechados, Bella parecia ter desmaiado de novo. Sua cor ainda não tinha voltado completamente.

Eu me virei para a secretária. Tomara que Bella esteja prestando atenção, eu pensei. Era assim que um humano deveria responder.

“Sra. Cope?”, eu perguntei, usando minha voz persuasiva de novo.

Seus cílios ondularam, e seu coração acelerou. Jovem demais, se contenha. “Sim?”

Isso era interessante. Quando a pulsação de Shelly Cope acelerava, era porque ela me achava fisicamente atraente, e não porque ela estava assustada. Eu estava acostumado com isso perto de humanas mulheres... mas ainda não havia considerado essa explicação para o coração acelerado de Bella.

Eu meio que gostei disso. Eu sorri, e a respiração da Sra. Cope aumentou de volume.

“Bella tem educação física na próxima aula, e não acho que ela está se sentindo bem o bastante. Você acha que poderia liberá-la da aula?”. Eu encarei seus olhos rasos, gostando do caos que se formou nos seus processos mentais. Seria possível que Bella...?

A Sra. Cope teve que engolir alto antes de responder. “Você também precisará de uma dispensa, Edward?”

“Não, eu tenho aula da Sra. Goff, ela não se importará”.

Eu não estava prestando mais muita atenção nela. Estava explorando esta nova possibilidade.

Hmm. Eu gostaria de acreditar que Bella me achava atraente como as outras humanas achavam, mas quando foi que Bella teve a mesma reação que outros humanos? Eu não devia alimentar minhas esperanças.

“Ok, tudo resolvido. Melhoras, Bella”.

Bella consentiu fracamente – exagerando um pouco.

“Você consegue andar, ou quer que eu te carregue de novo?”, eu perguntei, divertido por sua péssima interpretação. Eu sabia que ela iria querer andar – ela não iria quer ser fraca.

“Eu vou andar”, ela disse.

Acertei de novo. Estava ficando bom nisso.

Ela se levantou, hesitando por um momento para testar seu equilíbrio. Eu abri a porta para ela, e nós saímos andando na chuva.

Eu a assisti levantar seu rosto para a chuva fina com seus olhos fechados, um leve sorriso nos lábios. No quê ela estava pensando? Algo nesta cena parecia estranho, e eu logo percebi por que esta postura parecia tão pouco familiar para mim. As garotas normais não levantariam o rosto para a garoa deste jeito – as garotas normais em geral usavam maquiagem, mesmo neste lugar úmido.

Bella nunca usava maquiagem, nem deveria. A indústria de cosméticos arrecadava milhões de dólares por ano de mulheres que tentavam obter peles como a dela.

“Obrigada”, ela disse, agora sorrindo para mim. “Vale a pena passar mal para perder a educação física”.

Eu olhei ao redor do campus, tentando pensar numa maneira de prolongar meu tempo com ela. “Disponha”, eu disse.

“Então você também está indo? Sábado, quero dizer?”. Ela soava esperançosa.

Ah, sua esperança era um alívio. Ela queria que eu, e não Mike Newton, estivesse com ela. E eu queria dizer sim. Mas havia tantas coisas para considerar. Primeiro, o dia estaria ensolarado no Sábado...

“Aonde vocês estão indo, exatamente?”, eu tentei manter minha voz indiferente, como se não me importasse muito. Mas Mike havia dito praia. Poucas chances de evitar a luz do sol ali.

“Até La Push, para a First Beach”.

Droga. Bom, era impossível, então.

De qualquer forma, Emmett ficaria irritado se eu cancelasse nossos planos.

Eu olhei para ela, sorrindo ironicamente. “Eu não acho que fui convidado”.

Ela suspirou, já resignada. “Eu acabei de te convidar

“Vamos eu e você não pressionar mais o pobre Mike nesta semana. Nós não queremos que ele quebre”. Eu pensei em quebrar o pobre Mike eu mesmo, e apreciei a imagem na minha mente intensamente.

“Mike bobão”, ela disse, o dispensando novamente. Eu sorri abertamente.

E então ela começou a andar para longe de mim.

Sem pensar na minha reação, eu a alcancei e a agarrei por trás de seu casaco de chuva. Ela parou num tranco.

“Onde você pensa que vai?”. Eu estava quase bravo por ela estar me deixando. Eu não tinha passado tempo suficiente com ela. Ela não podia ir, não ainda.

“Para casa”, ela disse, confusa sobre o porquê disso me chatear.

“Você não me ouviu prometendo te levar para a casa em segurança? Você acha que eu vou te deixar dirigir nesta condição?”. Eu sabia que ela não ia gostar disso, minha insinuação de fraqueza por parte dela. Mas eu precisava mesmo praticar para a viagem a Seattle. Ver se eu conseguia suportar estar próximo dela num lugar fechado. Esta jornada seria muito mais curta.

“Que condição?”, ela demandou. “E a minha picape?”

“Vou pedir para Alice leva-la depois da aula”. Eu a puxei de volta até meu carro cuidadosamente, já que agora sabia que até andar para frente era desafiador o bastante para ela.

“Me solta!”, ela disse, se retorcendo e quase tropeçando. Eu estendi uma mão para segurá-la, mas ela se endireitou antes que isso fosse necessário. Eu não deveria estar procurando por desculpas para tocá-la. Isso me fez lembrar da reação da Sra. Cope a mim, mas eu guardei o pensamento para mais tarde. Havia muito mais a ser considerado naquela história.

Eu a soltei ao lado do carro, e ela se chocou com a porta. Eu teria que ser ainda mais cuidadoso, com seu equilíbrio ruim...

“Você é tão mandão!”

“Está aberta”.

Eu entrei do meu lado e liguei o carro. Ela se contraiu rigidamente, ainda lá fora, apesar de que a chuva havia apertado e eu sabia que ela não gostava de frio e de umidade. Seu cabelo grosso estava encharcado, quase preto.

“Eu sou totalmente capaz de dirigir até minha casa!”

Claro que ela era – só que eu não era capaz de deixá-la partir.

Eu desci o vidro do lado dela e me inclinei em sua direção, “Entre, Bella”.

Seus olhos se estreitaram, e eu pude ver que ela estava ponderando se fugia ou não.

“Eu vou te arrastar de volta”, prometi, gostando do desapontamento em seu rosto quando ela percebeu que eu estava falando sério.

Com o queixo rígido, ela abriu a porta e entrou. Seu cabelo escorria no couro e suas botas rangiam uma contra a outra.

“Isto é completamente desnecessário”, ela disse friamente. Achei que, por trás de sua atitude, ela parecia embaraçada.

Eu liguei o aquecedor para que ela não se sentisse desconfortável, e liguei o rádio num volume razoável de música ambiente. Eu dirigi até a saída, a vigiando do canto do meu olho. Seu lábio inferior fazia um beicinho teimoso. Eu fiquei olhando, examinando como isso fazia eu me sentir... pensando na reação da secretária de novo...

De repente ela olhou para o rádio e sorriu, seus olhos se arregalando. “Clair de Lune?”, ela perguntou.

Fã de clássicos? “Você conhece Debussy?”

“Não muito”, ela disse. “Minha mãe põe bastante música clássica pela casa – só conheço minhas favoritas.

“É uma das minhas favoritas também”. Eu fiquei olhando a chuva, considerando. Eu realmente tinha algo em comum com a garota. Estava começando a pensar que éramos opostos em todos os aspectos.

Ela parecia mais relaxada agora, olhando para a chuva como eu, olhando mas sem ver. Eu aproveitei o momento de distração para experimentar como seria respirar.

Eu inalei cuidadosamente pelo nariz.

Potente.

Eu agarrei o volante com mais força. A chuva deixou seu cheiro melhor. Eu não havia pensado nessa possibilidade. Estupidamente, de repente eu estava imaginando qual seria o seu gosto.

Tentei engolir contra o fogo na minha garganta, pensar em outra coisa.

“Como é a sua mãe?”, eu perguntei para me distrair.

Bella sorriu. “Ela se parece bastante comigo, mas é mais bonita”.

Eu duvidava.

“Eu tenho muito de Charlie em mim”, ela continuou. “Ela é mais extrovertida que eu, e mais corajosa”.

Duvidava disso também.

“Ela é irresponsável e um tanto excêntrica, e uma cozinheira totalmente imprevisível. É minha melhor amiga”. Sua voz agora estava melancólica; sua testa se enrugou.

Novamente, ela soava mais como mãe que como filha.

Eu parei na frente da casa dela, me perguntando um pouco tarde demais se eu deveria supostamente saber onde ela morava. Não, isso não seria suspeitoso numa cidade pequena, com seu pai sendo uma figura pública...

“Quantos anos você tem, Bella?”. Ela devia ser mais velha que seus colegas. Talvez ela tivesse começado a escola atrasada, ou havia sido reprovada... mas isso não parecia muito provável.

“Dezessete”, ela respondeu.

“Você não parece ter dezessete”.

Ela riu.

“O quê?”

“Minha mãe sempre fala que eu nasci com trinta e cinco e a cada ano me aproximo mais da meia-idade”. Ela riu de novo, e suspirou. “Bem, alguém tem que ser o adulto”.

Isso clareou as coisas para mim. Eu podia ver agora... como a mãe irresponsável ajudava a explicar a maturidade de Bella. Ela teve que crescer logo, e se tornar a responsável. Era por isso que não gostava de ser cuidada – ela achava que era a sua função.

“Você também não parece muito um cara do segundo ano”, ela disse, me arrancando dos meus pensamentos.

Eu fechei a cara. Para cada coisa que eu percebia sobre ela, ela percebia muito mais em troca. Eu mudei de assunto.

“Então por que sua mãe se casou com Phil?”

Ela hesitou um pouco antes de responder. “Minha mãe... ela é muito jovem para sua idade. Eu acho que Phil a faz se sentir ainda mais jovem. E de qualquer forma, ela é louca por ele”. Ela balançou a cabeça indulgentemente.

“E você aprova?”, eu imaginei.

“Isso importa?”, ela perguntou. “Eu quero que ela seja feliz... e é ele que ela quer”.

A total falta de egoísmo na resposta dela deveria ter me chocado, mas ele se encaixava muito bem com tudo o que eu havia aprendido sobre sua personalidade.

“Isso é bem generoso... eu fico pensando”.

“O quê?”

“Você acha que ela estenderia a mesma cortesia a você? Não importando quem você escolhesse?”

Era uma pergunta idiota, e eu não consegui manter meu tom de voz casual enquanto a fazia. Que estúpido pensar que alguém aprovaria a mim para sua filha. Que estúpido sequer pensar que Bella algum dia me escolheria.

“Eu-eu acho que sim”, ela gaguejou, reagindo ao meu olhar. Medo... ou atração?

“Mas também, ela é a mãe, É um pouco diferente”, ela terminou.

Eu sorri ironicamente. “Ninguém muito assustador então”.

Ela sorriu para mim. “O que você quer dizer com assustador? Vários piercings no rosto e tatuagens enormes?”

“Esta é uma definição, eu suponho”. Uma definição nada ameaçadora, a meu ver.

“Qual a sua definição?”

Ela sempre fazia as perguntas erradas. Ou talvez exatamente as perguntas corretas. Aquelas que eu não queria responder, de forma alguma.

“Você acha que eu poderia ser assustador?”, eu perguntei, tentando sorrir um pouco.

Ela pensou a respeito antes de me responder, numa voz séria. “Hmm... eu acho que você poderia, se você quisesse”.

Eu estava sério também. “Você está com medo de mim agora?”

Ela respondeu de uma vez, sem pensar. “Não”.

Eu sorri com mais facilidade. Não achava que ela estava sendo totalmente sincera, mas também não estava mentindo. Pelo menos ela não estava tão assustada a ponto de querer partir. Eu imaginei como ela se sentiria se eu lhe dissesse que ela estava tendo esta discussão com um vampiro. Eu recuei internamente de imaginar sua reação.

“Então, agora você vai me contar sobre sua família? Deve ser uma história muito mais interessante que a minha”.

Mais assustadora, pelo menos.

“O que você quer saber?”, eu perguntei cuidadosamente.

“Os Cullen te adotaram?

“Sim”.

Ela hesitou, e então falou baixo: “O que aconteceu com seus pais?”

Isso não era tão difícil; eu nem estava tendo que mentir para ela. “Eles morreram há muito tempo atrás”.

“Sinto muito”, ela murmurou, claramente preocupada se tinha me magoado.

Ela estava preocupada comigo.

“Eu não me lembro deles tão bem assim”, certifiquei-a. “Carlisle e Esme têm sido meus pais por um bom tempo agora”.

“E você os ama”, ela deduziu.

Eu sorri. “Sim. Não consigo imaginar duas pessoas melhores”.

“Você é muito sortudo”.

“Eu sei que sou”. Nesta circunstância, a respeito de meus pais, minha sorte não podia ser negada.

“E seus irmãos e irmãs?”

Se eu a deixasse pressionar muito por detalhes, eu teria que mentir. Eu olhei para o relógio, decepcionado que meu tempo com ela havia acabado.

“Meu irmão e irmã, e Jasper e Rosalie também, vão ficar bem chateados se tiverem que ficar me esperando na chuva”.

“Oh, desculpe, acho que você tem que ir”.

Mas não se moveu. Ela não queria que o tempo tivesse acabado, também. Eu gostava muito, muito disso.

“E você provavelmente quer sua picape de volta antes que o Chefe Swan chegue em casa, pois assim você não precisaria contar a ele sobre o que aconteceu na aula de Biologia”. Eu sorri com a memória de como ela estava embaraçada em meus braços.

“Eu tenho certeza que ele já escutou. Não há segredos em Forks”. Ela disse o nome da cidade com bastante desgosto.

Eu ri de suas palavras. Realmente, não havia segredos. “Se divirta na praia”. Eu olhei a chuva, sabendo que não duraria, e desejando mais do que o normal que durasse. “Que o tempo esteja bom, para banhos de sol”. Bem, no Sábado estará. Ela iria gostar disso.

“Não te vejo amanhã?”

A preocupação em seu tom me agradou.

“Não. Emmett e eu começaremos o fim de semana mais cedo”. Eu estava maluco comigo mesmo por ter feito planos. Eu poderia cancelá-los... mas neste ponto caçar nunca era demais, e minha família já estava preocupada o suficiente com meu comportamento sem que eu revelasse o quão obsessivo estava me tornando.

“O que vocês vão fazer?”, ela perguntou, não soando feliz com minha revelação.

Bom.

“Nós vamos escalar nas montanhas Wilderness, ao sul de Rainier”. Emmett estava ansioso pela temporada de ursos.

E quando eu olhei para ela, comecei a me sentir quase agonizante com a idéia de ter que dizer um adeus, mesmo temporário. Ela era tão delicada e vulnerável. Parecia tolice deixá-la fora do meu campo de visão, onde qualquer coisa podia acontecer com ela. Ainda assim, a pior coisa que poderia acontecer com ela resultaria de ela estar comigo.

“Você faz algo por mim neste final de semana?”, eu perguntei seriamente.

Ela assentiu, seus olhos arregalados e intrigados pela minha intensidade.

Manter a leveza.

“Não se ofenda, mas você parece ser uma dessas pessoas que simplesmente atraem acidentes como um ímã. Então... tente não cair no oceano ou ser atropelada ou nada do gênero, tudo bem?”

Eu sorri para ela com compaixão, esperando que ela não pudesse ver a tristeza nos meus olhos. Como eu queria que ela não estivesse muito melhor longe de mim, não importando o que pudesse acontecer.

Corra Bella, corra. Eu te amo demais, pelo seu bem ou pelo meu.

Ela havia se ofendido com a minha provocação, e me encarou. “Vou ver o que posso fazer”, ela disse apertando a mandíbula, saindo na chuva e batendo a porta do carro com toda a força que tinha.

Justamente como um gatinho que pensava que é um tigre.

Eu curvei minhas mãos sobre as chaves que havia acabado de pegar do bolso da jaqueta dela, e sorri enquanto saía com o carro.

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